São Carlos
SÃO CARLOS: IMAGENS DO PASSADO DE UMA CIDADE DO CAFÉ
APRESENTAÇÃO
O
acervo inclui apenas fotografias antigas da cidade de São Carlos
realizadas por diversos fotógrafos, amadores e profissionais. Foi
constituído durante o desenvolvimento de um projeto de pesquisa da
Profa. Dra. Maria Ângela P. C. S. Bortolucci (EESC/USP) financiado pela
FAPESP em 1986-7.
A obtenção das imagens se deu por doação ou
empréstimo de negativos e/ou ampliações. Foi feita uma busca junto às
instituições, mas também, através da divulgação na mídia local, foi
obtido um número significativo de fotografias de coleções particulares.
Vale
ressaltar a grande colaboração na época do fotógrafo Paulo Pires, tanto
na execução das novas ampliações, como na constituição do acervo,
cedendo muitas imagens de sua própria coleção.
HISTÓRICO
O
surgimento do povoado de São Carlos remonta à abertura do caminho para
as minas de Cuiabá em 1799. É, portanto, anterior à onda expansionista
do café na região, mas, sem dúvida, o seu desenvolvimento deve muito ao
ciclo do chamado ouro verde.
São Carlos está localizado a cerca de
50 quilômetros do centro geográfico do estado de São Paulo na região
outrora chamada de Campos de Araraquara. Esta denominação que
caracterizava genericamente a região central do estado situada ao norte
do rio Piracicaba, e que passou a ser ocupada de forma mais expressiva
a partir da primeira metade do século XIX, apresentando fortes vínculos
na sua expansão com o progressivo aumento da produção de café. A
riqueza proporcionada pelo café permitiu a consolidação e a criação de
muitos municípios.
Foi neste contexto que São Carlos – a partir da
vontade de alguns proprietários de fazendas locais, embora sediados em
Araraquara (1817) – iniciou sua trajetória de crescimento e
emancipação. Em 1958, São Carlos, que ainda era distrito de Araraquara,
tornou-se freguesia; em 1865 foi elevada a vila e, em 1880, já ganhava
a condição de cidade.
Vale lembrar que as primeiras fazendas abertas
na região tiveram por finalidade a criação de gado (bovino e suíno) e o
plantio de cana-de-açúcar, algodão e cereais.
O café só chegou a São
Carlos por volta de 1838 por intermédio de Carlos José Botelho que
plantou as primeiras mudas na fazenda Pinhal.
Esta riqueza,
entretanto, não se confirmaria sem a solução do problema de escoamento
da produção. O transporte em lombo de burro era um entrave que
precisava ser contornado e, sem maiores ponderações, a ferrovia foi
implantada rapidamente, chegando a São Carlos ainda em 1884 (a linha
férrea Santos- São Paulo - Jundiaí havia sido inaugurada em 1867). A
instalação da ferrovia concorreu para resolver também um outro problema
dos fazendeiros, a mão-de-obra necessária à lavoura cafeeira.
Ainda
em 1876, Antonio Carlos de Arruda Botelho (o Conde do Pinhal) trouxe os
primeiros imigrantes para trabalhar na fazenda Pinhal – 100 famílias
alemães. Esta imigração, que se intensificaria já no início da década
seguinte, vai elevar a participação de estrangeiros para um oitavo da
população em 1886, assegurando uma predominância marcante de italianos.
Em 1899, a população rural era de 15.688 trabalhadores, dos quais
13.418 eram imigrantes e, destes, 10.396 eram italianos.
São Carlos
recebeu muitos melhoramentos, a partir das últimas décadas do século
XIX, quase sempre financiados pela aristocracia cafeeira: Matadouro
(1886), Lazareto (1888), Cemitério Novo (1890), Teatro Ipiranga (1892),
iluminação elétrica particular e urbana (1893), Jardim Público (1894),
bondes de tração animal (1895), abastecimento de água (1899), Santa
Casa de Misericórdia (1899), rede de esgoto (1900), bondes elétricos
(1914) etc.
Até os primeiros anos da segunda metade do século XX,
São Carlos conseguiu manter quase inalterada a feição de uma típica
cidade do café comum a quase todas da região. Isto significa dizer que
prevalecia no seu contexto urbano as edificações marcadas pela vertente
clássica da arquitetura. Esta presença classicizante ainda é percebida
em parte da arquitetura remanescente, tanto nos antigos palacetes da
elite cafezista e mesmo nas construções mais acanhadas, seja no uso de
platibanda, cimalhas e demais ornamentos, ou simplesmente numa
insistente simetria. Em sua maioria ainda são edifícios construídos no
alinhamento da calçada e elevados em relação ao nível da rua por causa
do porão, preservando um ar de suntuosidade que crescia na medida em
que o poder aquisitivo dos proprietários o permitia.
Ainda antes da
crise de 1929, a cultura cafeeira em São Carlos já iria mostrar sinais
de decadência em virtude, principalmente, do esgotamento do solo da
região. A partir das primeiras décadas do século XX, duas vertentes
econômicas iriam, gradativamente, se afirmar: no ambiente rural, a
diversificação de atividades com a pecuária (como produtor de leite) e
com outras culturas (como foi o caso do cultivo do algodão incentivado
pela própria indústria local), em substituição ao plantio intensivo do
café dos tempos áureos; e, no ambiente urbano, a intensificação da
vocação industrial que ocorria até então de forma incipiente com
pequenas fábricas de fundo de quintal em sua maioria.
Ao longo das
últimas décadas, o setor industrial evidencia uma tendência à
especialização com a implantação de muitas indústrias de alta
tecnologia, certamente uma conseqüência da concentração de instituições
de ensino e pesquisa ocorrida a partir da metade do século XX (em
especial UFSCar, USP e Embrapa).
Este panorama de crescimento
econômico coloca para o patrimônio arquitetônico remanescente uma
perspectiva muito sombria, em função da falta de políticas municipais
que contemplem a sua preservação, deixando ao sabor apenas dos
especuladores imobiliários a decisão do que deve permanecer como
referência do passado para as gerações de hoje e de amanhã.
São Carlos, maio de 2004
Profa. Dra. Maria Ângela P. C. S. Bortolucci
Departamento de Arquitetura e Urbanismo - EESC/USP